O voô de Joaquim Flores


Você já viu um tucano em nossas matas e florestas? Conhece as diferentes espécies desta ave Silvestre? Seus hábitos alimentares? Ou já ouviu algum comentário como eles são importantes para a preservação de nossa flora?

O tucano é uma ave da familia Ramphastidae, que vive nas florestas da America Central e America do Sul. Seu nome é originario do tupi “takana” que significa bico grande e oco. São frugívoros (se alimentam de frutas) e também necessitam de um determinado teor protéico, por isso complementam sua dieta com insetos e algumas vezes ovos de outras aves, quando a alimentação fica escassa. São monogâmicos, territorialistas e ambos os sexos trabalham no cuidado dos filhotes, a femea choca e o macho alimenta-os. 
Com seus imensos bicos abocanham as maiores sementes da Palmeira Juçara, e com isso garantem a preservação do palmito nas áreas remanescentes de Mata Atlântica. As sementes maiores possuem maior quantidade de água, por isso a garantia de germinar, crescer e tornar-se uma árvore é maior. Um estudo da USP analisou áreas onde os tucanos não habitam mais e constatou uma diminuição na quantidade de novas palmeiras nestas áreas. 

Um dia uma amiga recebeu em sua casa  um presente especial um filhote de tucano, que havia sido encontrado por algumas crianças sozinho as margens de uma aréa de manancial perto da cidade de Mauá. Sabendo do problema que é ter animais silvestres tentamos re-introduzi-lo na mata que havia perto de sua casa, mas como era muito pequeno e frágil não sabia se alimentar e seria facilmente uma presa para qualquer predador. Foi quando começou a odisséia do Tucano Joaquim Flores.

Joaquim Flores então passou a ser um objetivo comum de um grupo de amigas que queriam ve-lo novamente em seu habitat natural. Após algumas discussões ficou definido que não o levaríamos para o Ibama, pois lá a situação das instalações são deploravéis, os animais ficam em gaiolas minúsculas e a falta de alimento é uma constante. Queríamos fazer diferente, queríamos fazer a diferença para a vida de Joaquim Flores.

Os tucanos não apresentam disformismos sexuais, mas o nosso foi batizado por Joaquim Flores, por pura intuição. Joaquim foi levado até a casa de uma amiga no litoral norte, lá foi construído um viveiro enorme com aproximadamente 25m2. Como a casa era em um condominio tivemos que conversar com o síndico, com o zelador, que não queriam se envolver com nada, pois o animal não era anilhado pelo IBAMA. Após diversas explanações sobre a real situação das instalações e da alta incidência de morte deste animais em gaiolas pequenas, conseguimos a autorização para a permanência do Joaquim. Para tal a funcionária de minha amiga ficou encarregada pela alimentação do nosso tucano. Todo o mês juntávamos o valor para manter a alimentação de Joaquim. Nada excepcional, pois o nosso amigo só comia frutas, especialmente caqui, sua preferência, e alguma ração para silvestres. Queríamos que ele aprendesse a comer com suas próprias mãos, ou melhor, com suas próprias patas, mas a nossa alimentadora oficial adorava mimar Joaquim com frutas cortadas e carinho na barriga.

E assim, foi vivendo Joaquim. Alguns vizinhos vinham para tirar fotos, todos os dias tinha o carinho de seus tratadores, em uma manhã chegava um galho novo no viveiro, na outra um nova fruta. Sua vida era calma, e  em seu dia-a-dia recebia muitas visitas inusitadas de seus parentes. Diversos tucanos vinham visitar Joaquim todas as manhãs. Isto nos deu uma esperança de talvez, conseguir reinseri-lo na mata.

 Paralelo a isso o síndico comecou a reclamar do barulho de Joaquim Flores. Barulho?? O condomínio foi construído no meio da mata Atlântica, onde tudo era para os animais. Jaguatiricas, lagartos e tucanos eram os unicos habitantes, daí vieram algumas pessoas e se sentem incomodadas pelo som que estes animais emitem??? Isso é inacreditável!!!

Enfim, um dia o síndico surtou em um ataque de poder e ruindade e exigiu que Joaquim Flores saísse imediatamente daquele condomínio. Minha amiga e eu estavamos viajando, mas felizmente a menina que cuidava dele conseguiu se articular e  encontrou um amigo que morava em um morro em Maresias no meio da mata fechada e levou Joaquim para lá.

Muitas vezes não entendemos como uma coisa ruim pode levar a uma coisa boa, mas a vida nos ensina que o bem no fim sempre vence, mesmo que antes do fim o protagonista sofra muito. E foi exatamente isso que aconteceu a Joaquim Flores. Ele foi levado para outro lugar, no meio da mata Atlântica, onde as visitas de seus semelhantes se tornaram cada vez mais frequentes. O Sr. Hélcio, dono da propriedade, comecou a deixar a porta do viviero aberta, para as visitas dos outros tucanos. Joaquim Flores saia para vôos em grupo, até o dia em que tomou um surra de seus compatriotas. Tudo sob o olhar atento do sr. Hélcio. A surra foi o batismo em sua sociedade. Depois deste acontecimento, os vôos em grupo se tornaram mais frequentes, mas no fim do dia Joaquim Flores sempre retornava ao conforto de seu lar, onde sr. Hélcio deixava o jantar pronto, mamão e caqui para serem devorados, quando do seu retorno.

Em uma manhã ensolarada Joaquim Flores saiu como de costume, mas no final da tarde não retornou. No dia seguinte, Sr. Hélcio esperava ansioso sua volta, o mesmo não apareceu, e assim se passaram inúmeros dias, e nada. Após algumas semanas, no início do outono, em uma manhã fria e nublada, sr. Hélcio estava na sacada de sua casa olhando o viveiro vazio e tomando uma xícara de chá quente, quando foi surpreendido com um revoada de dezenas de tucanos. Eram tucanos de todos os tipos: de bico amarelo, de bico verde escuro, vários filhotes, tinha até o tucano de bico preto que já esta entre as espécies ameaçadas de extinção, quando Joaquim Flores pousou no alto de seu viveiro, e olhou diretamente na direção do Sr. Hélcio. Seus olhos se comunicaram em silêncio.  E como uma língua que poucos entendem, Joaquim Flores estava lhe agradecendo pelas frutas maduras, pela porta aberta da gaiola, pelo carinho da construção do viviero que lhe serviu de abrigo por muitas noites, pela força de acreditar que ele pudesse se integrar novamente em seu habitat. E na troca daquele olhar sr. Hélcio entendeu tudo. Era a natureza agradecendo o simples respeito pelo direito de viver. E Joaquim Flores voou juntamente com os seus, e aquele olhar foi a despedida para o sonho de viver no infinito da liberdade.









Comentários

  1. Linda história!!! Conheci esse bichinho maravilhoso e fiquei encantada :) ele adorava um carinho na barriguinha! Saudades dele...
    Beijos

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    1. Não tinha visto o comentário. Vou começar a escrever novamente neste blog. Beijos

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